Inteligência Artificial e submissões jurídicas, como usar dados com responsabilidade

21 de outubro de 2025

Por Priscilla Adaime

Foto Inteligência Artificial e submissões jurídicas, como usar dados com responsabilidade

No primeiro artigo desta série, falamos sobre a transformação digital dos diretórios jurídicos e como a inteligência artificial está redesenhando o conceito de reputação no mercado, mas há um ponto crucial que começa a emergir dessa nova realidade, o uso ético dos dados. Com cada vez mais informações sendo processadas por sistemas automatizados, os escritórios enfrentam um desafio delicado: aproveitar o poder da tecnologia sem colocar em risco a confidencialidade que sustenta a própria credibilidade da advocacia.

A inteligência artificial pode, de fato, revolucionar o processo de submissão. Ela organiza, analisa e identifica padrões que antes dependiam de longas planilhas e esforços manuais. Modelos de linguagem e plataformas analíticas permitem mapear histórico de casos, volume de demandas e até frequência de citações em diretórios e publicações especializadas. No entanto, quanto mais precisos os dados, maior o risco de exposição.
O grande dilema é saber onde termina a eficiência e onde começa a violação do sigilo.

Ferramentas de IA abertas, como ChatGPT ou Gemini, não são adequadas para processar informações sensíveis. Quando um escritório insere dados de casos concretos, nomes de clientes ou detalhes confidenciais em plataformas públicas, ele compartilha essas informações com sistemas que armazenam, processam e, em alguns casos, treinam novos modelos com base nesses insumos. Isso significa que qualquer dado inserido pode, em teoria, ser replicado ou acessado de forma indevida, o que contraria diretamente os princípios éticos e as normas da OAB sobre confidencialidade profissional.

A alternativa é adotar soluções internas e seguras. Escritórios que desejam usar inteligência artificial em suas estratégias de submissão devem investir em modelos fechados, com servidores privados, controle de acesso e criptografia ponta a ponta. Além disso, é essencial definir protocolos de anonimização, substituindo informações sensíveis por descrições genéricas e estruturadas. Por exemplo, em vez de citar “processo envolvendo a empresa X”, o texto pode referir-se a “uma companhia de grande porte do setor industrial”. Essa prática protege o cliente, sem comprometer o valor estratégico da submissão.

Mais do que uma questão técnica, trata-se de gestão de risco reputacional. Um escritório que expõe dados de clientes, mesmo de forma não intencional, coloca em jogo não apenas a confiança conquistada, mas também sua elegibilidade em rankings e premiações. Os próprios diretórios vêm reforçando políticas de segurança, exigindo maior transparência sobre as fontes de informação e o tratamento de dados. O uso indevido de IA pode, portanto, gerar consequências sérias, inclusive a desclassificação em pesquisas ou restrições futuras de submissão.

Por outro lado, quando utilizada de forma ética e estruturada, a tecnologia pode ser uma aliada poderosa. Softwares de automação seguros ajudam a consolidar indicadores de performance, monitorar menções na mídia e cruzar dados de ranqueamentos anteriores, oferecendo uma visão mais completa da reputação do escritório. A IA, nesse contexto, deixa de ser um risco e passa a ser um instrumento de inteligência estratégica, capaz de transformar informação em vantagem competitiva, sem comprometer a essência da advocacia.

O futuro das submissões jurídicas não será apenas mais rápido, mas mais consciente. A combinação entre tecnologia e ética determinará quais escritórios conquistarão reconhecimento de forma sustentável. Em um mercado em que reputação e confiança valem mais do que qualquer métrica, os dados só terão valor quando forem usados com responsabilidade.